segunda-feira, 4 de fevereiro de 2013

Seis.

Noite passada você deveria ter vindo. Quase enlouqueci. Meu cérebro choveu. Pude jurar que não cessaria. Caiu granizo, meu telhado se quebrou, perdi o teto, não ganhei estrelas. Tudo devido ao pensamento endiabrado de que todas as minhas histórias terminaram com reticências. Cruciante. Odeio o incompleto, você sabe, sempre te pedi respostas e soluções, nunca as ganhei. Existem inúmeros outros rascunhos na minha vida além de você e todos eles nunca se findaram. Vivo mil passados por dia, choro cada um, só escrevo o seu.
Dormi pensando em não acordar e em não ter que continuar mantendo o paralelismo de saudades dentro de mim. A lembrança do seu abraço é lastimável. Nos encontramos no lugar que havia previsto, o mais improvável e urbanizadamente poético, mas foi o dia errado. Mesmo que não tenha transparecido, quis muito te abraçar. Te abraçar pelo resto do dia, balbuciar os poemas que guardo na carteira e segurar sua mão, como quem segura a borboleta que precisa voar. De alguma forma você sempre teve consciência disso.
Há seis meses eu o vi e, desde então, você tem estado em mim. Quase cinco mil horas o esperando. Essa é minha cota de auto-humilhação diária, todos possuímos uma. O tempo é vetor. Na primeira semana não diria que estaria aqui, hoje, ainda, escrevendo. Estou. Talvez eu lamente, talvez sorria para o relógio. Não faço ideia de quem seja você na minha estrada, mas não espero que se nomeie como Ana. Ana, dos labirintos, no bar da faculdade, personagem secundário e passageiro, nada além da rima.
Nunca te deixei, meus sonhos são testemunhas. Encontrei sua presença neles, muitas vezes. Todos foram tristes, distantes, que me fizeram visualizar coisas das quais não quero para mim. Dentre elas, ser quem você tem medo. Possuímos a mesma capacidade de nos destruímos e eu jamais tive mais medo do que amor pelas suas garras afiadas. Saí correndo inúmeras vezes por justamente isso: não ter medo do que deveria me amedrontar era desesperador. Me vi crescer com a tortura que sua voz me proporcionava, aprendi a lidar com as emoções ácidas vindas do seu riso.
Continuo protegendo seu nome e espero conseguir decifrar seus segredos de liquidificador, triturados.
Meu olhar se arrasta e minha garganta engole ódio seco todas as vezes que dedos alheios deslizam pelas minhas coxas frias. Por que só você nunca se entregou? Todo samba bonito já foi meu, menos o seu.
Te mandar embora não resolve metade do meu problema. Quem deve ir sou eu, mas a tristeza vicia. Por hora, durmo na mesma cama, descanso em lugar nenhum. Quando choro, perco - sabe-se lá onde - o desejo de te escrever. Minhas palavras são lágrimas que resolvo não libertar por pena de deformar meus voos. Voos tais que, assiduamente, são reprogramados pela minha lucidez. A embriagues sempre me mandar bater asas do seu lado. Felizmente não sei flutuar nas nuvens como você.
Se eu cantar, baixinho, de madrugada, no seu ouvido, músicas que não são nossas, ri. Ri porque também não somos nossos, nunca seremos, e isso é como uma vírgula batida no lugar indevido. Um dia desaparece, ou fica para sempre, expondo o erro.
Minha metralhadora cheia de mágoas me transporta à infernos que você já conheceu, um dia. Consigo administrar bem todo esse fracasso.
Diria que desculpo o fogo que colocou nos meus pés, mas você nunca se arrependeu de nada, nem mesmo de me deixar ir. Contudo, dentro, nas esquinas do cosmo de mim, te perdoo quando volto aqui, no pedaço de mundo que era nosso e danço.
Ainda está escrito maktub?
Acho que eu gostaria das cores se elas fossem suas. A cidade não é grande assim, nós não estamos tão remotos e há uma infinita possibilidade de acabarem nos encontrando quebrando a vidraça do tempo por aí.
Seu cabelo continua bonito, seus olhos não.
Somos quem não éramos, isso é incessável, por mais que lutemos. Mortos não ressuscitam.
Tenho em mim todas as desgraças do mundo e você é a mais deformadamente bonita delas.


(Yasmin)

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